← voltar
Ricardo Paulino, 30 anos, Arquitecto, For Studio Architects
Formámos o colectivo For Studio Architects (2010) tal como ele funciona hoje (eu e a Ivone Gonçalves em Lisboa, o Fábio Neves em Genebra e o Luís Ricardo em Estugarda) por necessidade absoluta.

Ricardo Paulino

30 anos
Arquitecto

Hoje não se começa na profissão com uma encomenda, começa-se a estagiar num ateliê sénior, como aconteceu com todos nós. Fizemos vários estágios, o estado a que a disciplina chegou não permite que seja de outra maneira. Para perderem a condição de estagiários, o Fábio e o Luís tiveram de sair de Portugal. Tivemos sorte nos locais onde estagiámos, nunca deixámos de ser projetistas e fomos sempre remunerados. Saímos de estruturas relativamente grandes para estruturas pequenas onde se tem de fazer quase tudo. Não é possível a um aluno que termina a sua formação começar a projectar sozinho ou então é muito complicado. Estagiei em Madrid com Antón García-Abril, em Portugal com MXT Studio (Telmo Cruz e Maximina Almeida). Foi muito importante esse período de aprendizagem, altura em que o ateliê conseguiu alguns primeiros prémios em concursos internacionais (Ponte pedonal e ciclável EXD09; Centro Náutico de Abrantes) e distinções como o prémio ENOR e onde estava muito envolvido em todo o processo – poderia participar ou fazer uma memória descritiva, fazer uma proposta de honorários ou construir uma maqueta. A Ivone e o Fábio também lá trabalharam. Na fase de estágios, decidimos participar num concurso internacional para o mercado municipal de Ermesinde e zona envolvente. Conseguimos uma menção honrosa, o que nos ajudou a ganhar balanço, foi um estímulo. Tivemos de arranjar um nome para o colectivo e pensar que podíamos dar sequência ao desejo de projetar em nome próprio. Ganhámos um ritmo de trabalho intenso e regular através de concursos, propostas de projeto e possíveis clientes, e sobretudo conseguimos construir um método de trabalho, o que nos facilitou a organização e melhorou os resultados. As pessoas à nossa volta perceberam a importância daquilo que estávamos a construir. Tivemos sempre consciência de que nesta disciplina os resultados demoram, e os processos são longos. Estamos agora a colher os frutos de trabalho que fizemos há um ou dois anos atrás. Passámos a trabalhar com a rpvp designers, que nos assegura a comunicação de uma forma profissional.

Imagine-se a quantidade de trabalho e o investimento envolvidos num concurso como o de Ermesinde, divididos por todos os participantes. São muitos milhares de euros. Não existe encomenda, só assim temos acesso ao que seria encomenda. Há falta de encomenda pela situação económica que atravessamos mas também porque os arquitetos não têm o reconhecimento legal adequado da sua profissão. A situação normal seria o mercado imobiliário reconhecer que os arquitectos são os únicos técnicos habilitados a fazerem projectos de arquitectura. Esta situação tem muito a ver com a forma como a sociedade olha para a profissão: não me parece que boa parte da população considere muito importante ter um arquitecto a fazer um projecto.

Desde a realização dos estágios que tive a possibilidade de ir a reuniões com clientes. Essa experiência, só passando por ela: estabelecer uma relação com pessoas com prioridades e visões diferentes. Tanto me aconteceu estar com alguém que, tendo visto o projecto de estruturas modulares para apoios de surf que fizemos (mais tarde chamado landcork) quer abrir um restaurante de praia, sem saber exactamente como o vai fazer; como com clientes que sabem o que pretendem do início ao fim de um processo. O lugar do arquitecto está sempre a ser desenhado pelos clientes. Há interlocutores para quem o papel dos arquitectos é claro, outros não têm ideia: é o que faz as plantas. A Ordem dos Advogados, que tem provavelmente mais recursos financeiros, fez uma campanha muito clara sobre os serviços que a classe presta. A Ordem dos Arquitectos faz um esforço, há a brochura Trabalhar com um arquitecto mas é preciso ter uma escala de intervenção maior. Não me esqueço de que se faz o que se pode, não quero descontextualizar. Os engenheiros têm um peso que podemos perceber, historicamente, pela necessidade que houve de recorrer às suas competências. Acho que tenho essa consciência porque pertenci à direcção de uma associação académica. Independentemente das motivações que levam as pessoas a cargos de direcção de instituições, é muito diferente dizer que não se fez nada e tentar contribuir. Na faculdade, com colegas meus, fizemos uma série de coisas: estivemos na direcção da associação académica, organizámos um ciclo de cinema, um conjunto de conferências com alguns dos mais reconhecidos arquitectos portugueses.

Os elementos do For Studio Architects sentem uma afinidade muito grande, formas de olhar para as coisas que têm pontos de encontro claros. Temos uma forma semelhante de ver a arquitectura – vimos da mesma formação e trabalhámos em ateliês idênticos. Une-nos também ter começado a trabalhar muito cedo. No meu caso, trabalhei primeiro com o meu pai; como técnico de enchimento na Central de Cervejas; como medidor orçamentista numa construtora. Este género de aprendizagens deixa um conhecimento e uma vivência. A flexibilidade é uma necessidade imperativa. Grandes ateliês de arquitectura estão com falta de encomenda. O nosso esforço é ir ao encontro de trabalho. Fazemos arquitectura, não sabemos fazer mais nada. Participámos num concurso internacional em Bilbau em 2011 em que fomos finalistas para projectar um jardim urbano. Todas as propostas eram muito de contemplação, naquele caso a nossa proposta era uma solução urbana para ser vivida permanentemente. Fizemos o pavilhão de Portugal para a feira internacional do livro de Bogotá onde Portugal foi país convidado de honra em 2013, um projeto para um espaço público com mais de três mil metros quadrados, e experimentámos o melhor da profissão: explicar o que fazemos a alguém; ao mesmo tempo convivermos com pessoas que reflectem, têm um pensamento sobre o mundo, sobre a vida, eis o mais reconfortante da prática profissional. Neste caso foi um processo que podemos chamar ideal porque foi muito rápido e em pouco tempo pudemos ver realizada a obra, três meses para projecto e obra. Isto permitiu-nos afinar o método de trabalho muito pela multidisciplinaridade que o projeto envolvia mas também pela rapidez com que o processo decorreu.

Somos um colectivo de arquitectos e, embora tenhamos outros projectos – eu por exemplo sou sócio da YOYO Objects, uma loja de mobiliário do século XX, o que também me exige muita atenção – reunimos todos os dias via skype. A distância a que estamos uns dos outros complica e torna mais difícil os processos. Por outro lado, leva-nos a ter mais disciplina e a concentrarmo-nos na necessidade imperiosa de usar o desenho como forma de mostrar, à distância, as nossas ideias. Estarmos em países diferentes é uma necessidade e ponto final. Mas existe uma concessão que ainda não fizemos. Nunca começamos um projecto sem estar fisicamente reunidos, nessa fase é importante que estejamos juntos.

Ricardo Paulino participou na Mostra #5 (6 de fevereiro de 2013, no Café na Fábrica, Lx Factory) e na conversa Eles contam a sua história (21 de março de 2013), ambas inseridas na temporada 3. O último dos eventos, realizado no Café da Ordem dos Arquitectos, no edifício-sede, teve a ver com o Prémio Estágios em Portugal e no mundo, lançado pelo Conselho Regional de Admissão do Sul com o objectivo de divulgar e premiar experiências relevantes decorrentes de estágios de jovens profissionais.

← voltar